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Conferência “O Brexit e a Aliança luso-britânica”

Patricia Akester • mar. 08, 2019

Decorreu ontem, dia 7 de Março, na Sociedade de Geografia de Lisboa, a Conferência “O Brexit e a Aliança luso-britânica”, proferida pelo Senhor Dr. Jorge Abreu, Presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa do Reino Unido.

A 22 dias do termo do prazo de 2 anos conferido pelo nº 3, do art. 50º, do Tratado da União Europeia (EU), para a concretização da saída da Reino Unido após a notificação prevista no número 2 do mesmo artigo, a Senhora Profª. Patrícia Akester e eu próprio entendemos muito oportuno assistir. Tanto mais que o Conferencista é, em razão da sua posição, um privilegiado conhecedor do chamado “Brexit”.

A Conferência foi muito interessante e após uma rápida contextualização histórica sobre do nascimento da EU, da sua evolução e instituições, o Conferencista explicou a realização do Referendo em 2016 sobre a saída ou não por parte do Reino Unido da União Europeia - o Brexit, como é conhecido.

Ainda nesta primeira parte, foi dado ênfase a quatro aspectos importantes:

- a “Torre de Babel” em que se transformou o Continente Europeu (com 47 países);

- a evolução federalista da EU com progressiva delapidação da Soberania dos Estados (o que sempre constituiu um óbice para o Reino Unido);

- a evolução demográfica negativa da Europa, que representava 25% da população mundial em 1900 e apenas 6% em 2015; e

- o “White Paper” da União Europeia de 2017 (um documento elaborado pela Comissão Europeia sobre o futuro da EU com os 27 Estados após a saída do Reino Unido), a que o Senhor Prof. Seromenho Marques já designou por uma espécie de Requiem de Mozart. Este documento, com efeito, identifica um conjunto de áreas que visam aprofundar ainda mais o federalismo, chegando mesmo a apontar a criação de um exército europeu, de um Ministério Público europeu e Fiscalidade europeia. Prepara ainda 5 Cenários para o futuro da EU.

Seguidamente, o Conferencista sintetizou os principais passos práticos do Brexit, quer na perspectiva da preparação feita pelos Governos do Reino Unido, de Portugal e da própria EU através da Comissão. Próximos passos esses que conhecerão desenvolvimentos com as programadas votações no Parlamento Britânico na próxima semana, designadamente no dia 11 a votação da Proposta de “saída com acordo” por parte da Primeira-Ministra Theresa May, no dia 12 (tendo sido derrotada a Proposta de “saída com acordo”), será votada a saída sem acordo e, não reunindo também uma maioria esta votação, será colocada à votação no dia 13 uma Proposta de adiamento da saída do Reino Unido (usando o mecanismo previsto no final do nº 3, do mencionado art. 50º do Tratado da EU, criando a oportunidade de uma nova negociação). Note-se, porém, que este mecanismo de um eventual adiamento do prazo de 2 anos que termina agora no dia 29 de Março, é conferido pelo Conselho Europeu por unanimidade. Isto é, não é uma decisão unilateral do Reino Unido. Embora seja de acreditar que, caso este país manifeste a intenção de um adiamento para negociar, a EU aceite tal adiamento. Provavelmente, até aliviada.

Finalmente, a Conferência dedicou-se ao tema das relações ancestrais e bilaterais entre o Reino Unido e Portugal, procurando discernir o futuro próximo dessas mesmas relações.

Evidentemente, foram passados em revista os principais Tratados entre os dois países, desde o primeiro Tratado em 1147 motivado pelo cerco e conquista de Lisboa, passando, entre outros, pelo Tratado de Windsor em 1386 (e a sua “amizade perpétua”), pelo Tratado de Methuen em 1703, até ao Tratado das Lages de 1943. Tratados estes que, sendo ainda matéria da reserva de Soberania dos Estados, se encontram genericamente em vigor quanto a todas as matérias que não ofendam os princípios do Direito da União Europeia.

Foram, ainda, apresentados os principais indicadores económico-sociais actuais, que ilustram a importância da ligação de Portugal e da nossa economia ao Reino Unido:

- o Reino Unido tem a 8ª maior comunidade portuguesa no mundo;

- o Reino Unido é o 4º cliente das nossas exportações;

- o Reino Unido é o 1º cliente das nossas exportações de serviços;

- o Reino Unido é o 8º fornecedor de Portugal;

- o Reino Unido representou 8 mil milhões de Euros para Portugal em 2017; e

- o Reino Unido enviou-nos 1,9 milhões de visitantes em 2017.

Daí que, para o Conferencista, seja essencial incrementar todas as medidas necessárias para acautelar a manutenção do actual status quo entre os dois países. O que, assegurou, o Primeiro-Ministro António Costa e Governo português estão a fazer activamente. Sublinhou mesmo medidas no sector financeiro que, em sua opinião, podem e devem alavancar as relações económicas bilaterais.

Evidentemente, ninguém pode antecipar nesta altura – não obstante as escassas 3 semanas de deadline – o que irá passar-se exactamente: se haverá um acordo de saída in extremis , se haverá um adiamento da saída ou se haverá uma saída sem acordo.

Pela minha parte, tenho há muito um palpite: uma saída sem acordo (independentemente de um adiamento de última hora). Por razões que não cabe aqui detalhar. Mas que se sintetizam assim: o Reino Unido tem estado na EU com um pé de fora; no futuro, o Reino Unido tem interesse em estar fora da EU com um pé dentro. Tal corresponde, aliás, ao ADN do Reino Unido, de reserva e desconfiança em relação ao Continente e de permanente envolvimento no Comércio global. Os custos políticos e financeiros serão menores e a negociação de um futuro acordo com a EU muito mais fácil que o actual “acordo de saída”.

Veremos até ao dia 29 de Março o next step . Provavelmente, só mais à frente saberemos o que vai realmente acontecer.

Art. 50º

1. Qualquer Estado-Membro pode decidir, em conformidade com as respetivas normas constitucionais, retirar-se da União.

2. Qualquer Estado-Membro que decida retirar-se da União notifica a sua intenção ao Conselho Europeu. Em função das orientações do Conselho Europeu, a União negocia e celebra com esse Estado um acordo que estabeleça as condições da sua saída, tendo em conta o quadro das suas futuras relações com a União. Esse acordo é negociado nos termos do n.o 3 do artigo 218.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. O acordo é celebrado em nome da União pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, após aprovação do Parlamento Europeu.

3. Os Tratados deixam de ser aplicáveis ao Estado em causa a partir da data de entrada em vigor do acordo de saída ou, na falta deste, dois anos após a notificação referida no n.o 2, a menos que o Conselho Europeu, com o acordo do Estado-Membro em causa, decida, por unanimidade, prorrogar esse prazo.

4. Para efeitos dos n.os 2 e 3, o membro do Conselho Europeu e do Conselho que representa o Estado-Membro que pretende retirar-se da União não participa nas deliberações nem nas decisões do Conselho Europeu e do Conselho que lhe digam respeito.

A maioria qualificada é definida nos termos da alínea b) do n.o 3 do artigo 238.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

5. Se um Estado que se tenha retirado da União voltar a pedir a adesão, é aplicável a esse pedido o processo referido no artigo 49.o.

Art. 49º

Qualquer Estado europeu que respeite os valores referidos no artigo 2.o e esteja empenhado em promovê-los pode pedir para se tornar membro da União. O Parlamento Europeu e os Parlamentos nacionais são informados desse pedido. O Estado requerente dirige o seu pedido ao Conselho, que se pronuncia por unanimidade, após ter consultado a Comissão e após aprovação do Parlamento Europeu, que se pronunciará por maioria dos membros que o compõem. São tidos em conta os critérios de elegibilidade aprovados pelo Conselho Europeu.

As condições de admissão e as adaptações dos Tratados em que se funda a União, decorrentes dessa admissão, serão objeto de acordo entre os Estados-Membros e o Estado peticionário. Esse acordo será submetido à ratificação de todos os Estados Contratantes, de acordo com as respetivas normas constitucionais.

Rui Horta Carneiro

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