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Directiva Mercado Único Digital: texto do trílogo aprovado em COREPER, consequências por stakeholder

Patricia Akester • fev. 20, 2019

Hoje, três anos após o arranque das discussões, em reunião do Comité de Representantes Permanentes da União Europeia (COREPER) do Conselho da UE, foi aprovado o texto da Directiva Mercado Único Digital resultante do acordo alcançado no passado dia 13 com a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu.

A versão acordada tem agora de ser aprovada pelo Parlamento, prevendo-se que ocorra até meados de Abril, dado que no final de Maio há eleições para o Parlamento Europeu.


Lembremos, sumariamente, as consequências por stakeholders:


a) Prestadores de serviços de partilha de conteúdos em linha, tais como Google, Facebook e YouTube

Não são obrigados a recorrer a medidas tecnológicas que impeçam usos ilícitos nos seus sistemas

Devem, sim, obter autorização para o uso de conteúdos protegidos nos seus sistemas, assim permitindo os autores e titulares de direitos recebam uma parte do valor gerado pela partilha desses conteúdos, partilha essa que naturalmente atrai e retém utilizadores

Mas se (apesar do que a Directiva denomina de «best efforts») as grandes plataformas não conseguirem obter autorização ou evitar actos ilícitos nos seus sistemas têm apenas (desde que devidamente notificadas pelos titulares de direitos) de tomar medidas para evitar o uso ilícito de conteúdos nos seus sistemas e, de forma expedita, remover ou impedir o acesso a conteúdos ilícitos. Ou seja, a ausência de notificação (que fica a cargo dos titulares de direitos) elimina a responsabilidade dessas plataformas

As micro e pequenas empresas (start ups) com um volume de negócios inferior a 10 milhões de Euros, cujos serviços se encontrem disponíveis ao público, na EU, há menos de 3 anos e com menos de cinco milhões de visitantes por mês estão sujeitas a obrigações mais leves

A Directiva não elimina, fora do seu âmbito, o recurso aos chamados preceitos porto-seguro da Directiva sobre o Comércio Electrónico que têm permitido que as grandes plataformas se afirmem, há duas décadas, como meros intermediários técnicos , obtendo lucros através da utilização gratuita de obras protegidas pelo direito de autor nos seus sistemas


b) Editores de imprensa

Podem obter uma remuneração justa e proporcionada pela utilização digital das suas publicações de imprensa por parte das grandes plataformas

Note-se que na Alemanha os editores de imprensa já têm um direito conexo neste contexto, tendo, todavia, optado por nada cobrar à Google uma vez que desparecidos os snippets dos resultados da Google viram reduzido, drasticamente, o acesso aos seus conteúdos

Cabe a cada Estado Membro assegurar que os jornalistas recebem uma parte adequada das receitas adicionais assim geradas

A Directiva não impede usos privados, nem abrange hiperligações para notícias acompanhadas de palavras soltas ou de excertos muito curtos livremente.


c) Wikipedia e open software

A utilização de conteúdos nas enciclopédias online sem objetivos comerciais, como a Wikipedia, ou em plataformas de desenvolvimento de software aberto, como o GiftHub, é lícita

d) Investigadores

Podem recorrer com mais facilidade a instrumentos inovadores de investigação de prospecção de textos e dados

Mas apenas as entidades sem fins lucrativos de investigação científica e de conservação do património cultural podem fazer prospeccção de textos e dados, para efeitos de investigação científica

A Directiva parte do princípio de que as entidades com fins lucrativos podem e devem obter licenças para fins de prospeccção de textos e dados junto dos titulares de direitos relevantes, bem como os investigadores não afiliados (cientistas independentes, start ups ou think-tanks, por exemplo).

É provável que o artigo 3 coloque a União Europeia em desvantagem em sede de investigação. O Japão, por exemplo, permite a prospeção de textos e dados sem levar em conta o estatuto da entidade que a leva a cabo e não limita o escopo da excepção à investigação científica sem fins lucrativos. E nos EUA, as entidades com fins lucrativos têm recorrido à excepção «fair use» para jusitificar a execução de reproduções de conteúdos protegidos para fins de prospeccção de textos e dados (como sucedeu no caso Authors Guild v. Google ).


e) Professores e alunos

Podem fazer utilizações digitais e transnacionais no domínio da educação, para que possam tirar pleno partido das tecnologias digitais em todos os níveis de ensino

Mas se os Estados Membros assim decidirem este privilégio podem perecer desde que acordos de licenciamento adequados às necessidades e especificidades dos estabelecimentos de ensino estiverem facilmente disponíveis no mercado


f) Instituições responsáveis pelo património cultural

Instituições como bibliotecas ou museus acessíveis ao público, arquivos, instituições responsáveis pelo património cinematográfico ou sonoro,

podem fazer cópias de obras que façam permanentemente parte das suas colecções para efeitos de conservação, na medida necessária para tal



g) Utilizadores:

Desde que as plataformas tenham obtido autorização, os utilizadores podem usar conteúdos para fins privados ou para fins comerciais desde que apenas obtenham proventos insignificantes

Podem fazer upload de conteúdos protegidos pelo direito de autor livremente desde que para citação, crítica, caricatura ou paródia. Isto é, as excepções relativas a citação, crítica, revisão, caricatura, paródia ou pastiche passam a ser obrigatórias para todos Estados Membros, ao invés de facultativas

Podem partilhar livremente memes ou gifs

Podem fazer hiperligações para notícias acompanhadas de palavras soltas ou de excertos muito curtos livremente. Isto é, os chamados snippets podem continuar a aparecer no Google News ou no Facebook desde que sejam muito curtos

As medidas tecnológicas para evitar o uso ilícito de conteúdos em linha não devem obstar a usos lícitos pelos utilizadores

Está prevista, à cautela, a criação de um mecanismo de reclamação e de recurso


h) Autores e artistas:

Os Estados Membros garantem que os autores e artistas recebem uma remuneração justa e proporcionada pela exploração das suas obras na Internet

Os Estados Membros garantem transparência quanto a receitas geradas e à remuneração devida (já prevista na Directiva sobre Gestão Colectiva)

Os Estados Membros garantem um mecanismo de ajustamento contratual a ser despoletado quando a remuneração inicialmente acordada é desproporcionadamente baixa. Isto é, os autores e os artistas poderão exigir uma remuneração adicional quando a remuneração inicialmente acordada seja desproporcionadamente baixa relativamente às receitas obtidas pela distribuidora

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